Imagine alguém que é forçado a escolher entre o pai e a mãe.

Que, no lugar do amor, começa a aprender o ódio.

Que tem que negar e matar metade de si mesmo.

Imagine alguém que só pode ver um dos pais com data marcada, como um presidiário.

Que passa a viver em uma prisão de solidão, medo e angústia.

Que vai se sentir culpado por toda a vida, mesmo sendo inocente.

Agora, imagine que esse alguém é só uma criança.

 

Os pais não se separam. Quem se separa é o homem e a mulher da relação conjugal[1]. A mãe e o pai permanecem: são os que deram a vida para este novo ser humano, que é formado pelos dois, fato genética e psicologicamente indiscutível.

É no núcleo familiar e no contato com as pessoas que convivem frequentemente com a criança no início da vida que ela recebe os estímulos para a formação de sua personalidade, que acontece ainda na primeira infância (de 0 a 7 anos). O Pai e a Mãe que geraram esta vida têm papel e responsabilidades fundamentais na maneira como a criança construirá seus vínculos amorosos: incluindo o amor-próprio.

Para explicar e embasar com total segurança o que proponho, recorro à ferramenta cientificamente comprovada chamada Eneagrama da Personalidade[2], que está integralmente alinhada com os mais profundos e atuais conhecimentos da medicina, neurociência e antroposofia, os quais explicam que o ser humano possui três centros principais de energia: o sentir, o pensar e o agir. Esses três centros estão ligados a três áreas do nosso cérebro: o bulbo cerebral – a parte do cérebro que rege os instintos, a ação; o sistema límbico – a parte responsável pelas emoções; e o córtex – a parte do conhecimento teórico, da razão (RISO; HUDSON, 2013). O Dr. Claudio Naranjo[3] relaciona esses três conhecimentos com a energia do feminino (o sentir), a do masculino (o pensar) e a infantil (o agir). Todos nós temos essas três energias dentro de nós, mas elas estão em desequilíbrio: esse desequilíbrio começa na infância, com as primeiras feridas emocionais da criança, quando ela interpreta a realidade com seu olhar infantil e cria estratégias de sobrevivência que supervalorizam um desses centros e invalidam outro(s). Assim, na vida adulta, podemos obervar diferentes perfis de personalidade de acordo com as atitudes que nutrem em momentos de dificuldades: muitos deixam de agir quando é necessário porque ficam pensando ou sentindo em excesso. Outras, agem compulsivamente, pois o impulso prevalece à necessidade de pensar ou sentir de forma equilibrada. A prevalência de um dos centros traz dificuldade em buscar auxílio nos outros para sair de determinada situação.

Quando, por exemplo, uma criança presencia o divórcio conflituoso dos pais, em que ela se torna objeto de disputa, e sente que necessita optar emocionalmente por um deles para que seja amada, sinta-se segura e pertencente (geralmente, por aquele que obtém a guarda), ela rejeita dentro de si a energia do masculino ou do feminino, necessitando, assim, de muitas defesas e, inconscientemente, começa a construir o desamor a si mesma.

Essa rejeição ao pai ou à mãe que lhe deu a vida causa muitos transtornos, pois, se ela é feita dos dois e um deles passa a ser uma pessoa “má”, a criança acredita que também tem essa característica, portanto, terá muita dificuldade em se aceitar e se relacionar, podendo, em casos mais severos, ter problemas graves de saúde, como depressão, síndrome do pânico, ansiedade, evoluindo para casos clínicos e patológicos.

 

“Quando uma criança é proibida de amar um de seus pais, ela deixa de amar metade dela.” Monja Coen

 

Pais, educadores, psicólogos, assistentes sociais e tantos outros agentes que intermediam e influenciam no desenvolvimento saudável do ser, precisam atentar para esse poderoso e transformador conhecimento. Que os pais, mesmo em sofrimento, possam enxergar os malefícios que o ódio a um dos cônjuges pode gerar na vida dessas crianças e o reflexo disso para toda a sociedade. A criança precisa de amor. Ela ama genuinamente as pessoas que lhe deram a vida, independentemente dos atos por eles praticados porque a criança não entende ainda a complexidade do mundo adulto. Seus sentimentos e sua natureza amorosa precisa ser plenamente cuidada e respeitada. Você, pai, você, mãe, que está em sofrimento após uma separação, olhe para seu filho com respeito ao outro progenitor dentro dele, pois também foi ele que permitiu que a maior dádiva fosse dada: a vida do seu filho.

Para auxiliar neste processo, é fundamental que você mergulhe na sua história, cure as suas feridas e transforme o seu olhar sobre você e o outro. O Eneagrama da Personalidade com a abordagem da infância é um excelente instrumento nesse resgate do amor-próprio e de melhoria nas relações.

 

Jaqueline Tartari

Transformadora na Sannyas

Educadora | Terapeuta | Coach

Mestre e especialista em Eneagrama da Personalidade com formações no Brasil e exterior.

Contato: jaqueline@sannyas.com.br

 

[1] Joan Garriga.

[2] Eneagrama da Personalidade é uma ferramenta cientificamente comprovada que integra conhecimentos da medicina, da psicologia do EU, da transpessoal e da terapia gestalt.

[3] Dr. Claudio Naranjo é um médico psiquiatra renomado, indicado ao Nobel da paz em 2015 e premiado 3 vezes consecutivas como Doutor Honoris Causa em Psicologia e Educação, que dedicou a vida ao estudo do comportamento humano e, nos últimos 45 anos, sistematizou vários saberes à ferramenta Eneagrama.